Quando eu era pequeno, lá na Interiorlândia, eu conheci a menina da bolha. Era engraçada, muito engraçada a menina da bolha. Desde o apelido, Pitunilda, até o jeitinho de rir, era engraçada. A Pitunilda era uma personagem única. Imagine alguém que só come chocolate e sorvete. Chocolate e sorvete. Fora isso, era na livre e espontânea obrigação.

Mas ela escutava Zé Ramalho. Comia sorvete e chocolate, era pequena, magrinha, baixinha, frágil, mas você corria risco real de vida se contaminasse ela. Ah se contaminasse ela... Dizem a boca pequena, lá na Interiorlândia, que beijo na boca para a Pitunilda era como participar de "No limite". Dizem. Muito amigo eu fui da Pitunilda, sempre curioso acerca da evolução daquela pequena notável. Tímida, extremamente tímida, com aquela risada engraçada, comendo chocolate e sorvete. Soube de um caso, em que alguns amigos foram recebidos na casa da Pitunilda para comer um bolo, de chocolate. Reza a lenda que um daqueles mais salientes (que toda festinha contempla) esboçou se jogar na cama da Pitu. Esboçou. Esboçou porque os físicos se enganaram, e o som do grito sozinho não só segurou o saliente no ar, como também colou o cidadão no guarda-roupas. Pasmem, não era rosa, o guarda-roupas.

Então veio a universidade, a mudança para a Capitalândia e a dúvida: Como a Pitunilda ia reagir a todo esse grau de contaminação!!! Nos primeiros anos, ela surfava no bus. Isso, surfava. Porque ela não podia encostar nos bancos. Nem nas barras de segurança. Nem nas pessoas, a menos que fossem as amigas dela. Então concluí que a bolha seria eterna. Só mesmo chocolate e sorvete.

A vida seguiu, a Capitolândia e seu corre-corre acabou por afastar as turmas, e perdi o contato com a Pitunilda. Até o dia que, em uma balada das fortes, eu vejo aquela cena estarrecedora: Recostada em um pilar (veja bem o grau de contaminação!), cerveja na mão direita, cigarro na mão esquerda está Pitunilda! Sem bolha, sem sorvete, sem chocolate, e pior: Beijando na boca!!! Resisti alguns momentos, conferi, esperei a iluminação ambiente melhorar, e após afastadas todas as dúvidas me apresentei para recolher as risadas que a situação requeria!

Segui achando aquela cena, de décadas atrás, chocante. Mas a Pitunilda continuava a transformação. A menininha que de tudo tinha medo, acabou virando o mundo. Morou em vários países, chegou a ter 3 empregos, e hoje é uma destemida cidadã do mundo. Uma cidadã do mundo de verdade, não daquelas que lê na internet as facetas de cada lugarejo. Ela foi lá, conheceu e se contaminou com muitos recantos mundo afora! Ou todos aqui acham que é fácil se virar lá fora sem família, com poucos amigos, e chocolates de diferentes marcas! Sem falar do sorvete, que cada leite é um leite!